Por que sonhamos e o que faz alguns sonhos se repetirem?
Uma menina de apenas 9 anos fez um questionário que movimentou uma equipe de cientistas. A jovem Mila O’Dea, moradora de Gamboa, no Panamá, expressou suas dúvidas no programa de rádio The Curious Cases of Rutherford & Fry (“Casos Curiosos de Rutherford & Fry”), apresentado pelos cientistas Adam Weir Rufherford e Hannah Fry, na BBC Radio 4.
A criança perguntou:
Mas afinal, por que sonhamos? E por que os sonhos se repetem?
Imagine a seguinte cena:
Você está no prédio de uma multinacional. Entra na sala do conselho, onde se depara com o diretor executivo rodeado de outros empresários. Estão todos prontos para entrevistar você para uma vaga de emprego. Mas logo você se dá conta de que se esqueceu de colocar a roupa e está completamente nu.
Não precisa se assustar! Foi só um sonho e essas experiências oníricas são muito comuns em todos os seres humanos. Também é muito comum a vontade de querer entender o motivo dos sonhos ao acordar.
Algumas curiosidades sobre sonhos
Algumas temáticas de sonho são muito comuns, como dente mole ou caindo, ou então reparar que está num lugar público totalmente nu, ou também realizar uma prova importante e perceber que não estudou e não entende nada do que está escrito. Esses sonhos refletem nossas preocupações e medos.
Outros tipos de sonhos podem ser muito divertidos como poder voar ou ser invisível. Também existem aqueles que são totalmente estranhos, com algum traço surreal.
Falando em surrealismo, existe uma lenda (que pode ser verdadeira) sobre Salvador Dalí. Dizem que ele costumava comer ouriços do mar cobertos de chocolate antes de dormir na tentativa de estimular os sonhos que inspirariam sua arte. Olhando algumas de suas criações, até que a teoria faz sentido. Veja a obra O Tempo:
Por que alguns temas e situações aparecem nos sonhos?
Vários cientistas de diferentes partes do mundo tentam elaborar teorias para responder a essa pergunta. Um dos pioneiros nessa área é Bill Domhoff. Ele coletou mais de 20 mil relatos de pessoas ao redor do mundo. A compilação forneceu material para um “banco de sonhos” online.
Segundo Bill, “Os sonhos dramatizam nossas preocupações e, muitas vezes, encenam o pior dos cenários. Como ser reprovado em uma prova ou esquecer o diálogo em uma peça de teatro”. Para o estudioso, nossos medos e preocupações fornecem material vasto para nossos sonhos. “Eles não só abraçam nossos desejos, mas nossas preocupações, nossos medos e nossos interesses. Se eu compilasse cem sonhos seus ao longo de várias semanas ou meses, encontraria vários temas e consistências”.
O que acontece com nosso cérebro quando sonhamos?
O fisiologista Eugene Aserinsky, da Universidade de Chicago, realizou uma importante descoberta em dezembro de 1951.
Para analisar as ondas cerebrais produzidas ao longo do sono de seu filho de 8 anos, Aserinsky conectou o garoto a um eletroencefalograma. Inicialmente, não foi notada muita atividade até que, repentinamente, as agulhas do aparelho começaram a se mover rapidamente.
Pensando que seu filho tivesse acordado, o cientista entrou no quarto e ficou surpreso ao ver que ele ainda estava dormindo. O monitor mostrava que os olhos e o cérebro da criança estavam bastante ativos.
Essa fase do sono foi chamada por Aserinsky de REM (Rapid Eye Movement), também conhecida pelo acrônimo MOR (Movimento Ocular Rápido).
A cada 90 minutos, em média, acontecem os ciclos MOR e eles podem durar até meia hora. Nos adultos, eles formam um quarto do sonho. Sempre que alguém acorda após passar por uma fase MOR, lembra-se de ter sonhado.
Atualmente já descobriu-se que sonhos podem ocorrer também durante outras fases do sono, quando nosso cérebro está muito menos ativo.
E o que acontece com o nosso corpo quando estamos dormindo?
Diferentemente de nosso cérebro, quando estamos dormindo o nosso corpo relaxa quase que totalmente. “Quando dormimos, o tônus muscular do corpo começa a diminuir e desaparece completamente ao entrar em MOR. Na verdade, os únicos músculos que estão trabalhando são o diafragma (para expandir os pulmões) e o coração”, explica o pesquisador Mark Balgrove, da Universidade de Swansea, no País de Gales.
“Essa perda de tônus pode acontecer para que a gente não aja fisicamente em toda cena que ocorre durante o sonho, que muitas vezes envolve movimento. Pode ser perigoso agir quando você está dormindo”, adverte Balgrove.
Várias teorias sobre a função dos sonhos:
Diversos estudiosos formularam ou contribuíram para a construção de diversas teorias que tentam explicar a função dos sonhos:
- Simulação de ameaça: Segundo Balgrove, as pessoas praticam nos sonhos como lidar com ameaças do mundo real: “Essa prática, embora você não consiga se lembrar ao acordar, ajuda você a se manter em forma durante as horas de consciência”.
- Consolidação da memória: Nessa teoria, existe a afirmação de que o cérebro trabalha na compilação de lembranças durante a noite. Assim, o estranhamento que às vezes se manifesta nos sonhos pode ser resultado da tentativa do cérebro de vincular duas coisas que normalmente existem de forma independente, mas precisam se relacionar.
- Redução do medo: Essa corrente defende que sonhando com nossos temores em um contexto diferente, estamos aprendendo a encarar e resolver nossos conflitos. Mas Balgrove adverte: “Existe a possibilidade de o sonho falhar. Neste caso, se transforma em pesadelo e dá medo”.
Grande parte da literatura universal fala sobre a possibilidade de os sonhos serem premonitórios, o que contribui para a crença popular.
Em 1970, um jornal inglês decidiu realizar um experimento com alguns de seus leitores. Foi solicitado que eles registrassem seus sonhos e, nos 15 anos seguintes, tentou relacionar os relatos com as notícias mundiais.
O resultado? Nenhum. Nada foi relacionado.
De qualquer forma, há uma escola de pensamento que afirma que os sonhos não possuem uma função evolutiva.
Bill Domhoff, criador do “banco de sonhos”, argumenta que eles são um efeito colateral acidental da evolução de nossas habilidades intelectuais desenvolvidas ao longo de milhões de anos. Uma conjuntura entre um estado de sono ativo misturada com grande capacidade cerebral.
Sendo assim, os sonhos podem ser um efeito colateral e acidental da nossa função cerebral.
Bill continua: “Acredito que os sonhos têm um significado psicológico, mas não acho que tenham um papel adaptativo”.
“Se eu tivesse acesso a 50 sonhos seus, teria uma boa ideia das suas preocupações, dos seus interesses, de quem você gosta ou não. Nesse sentido, eles não são sandices aleatórias, são retratos psicológicos, pegadas digitais da sua mente”.
A teoria da “Zona Quente”
Na Universidade de Lausanne, na Suíça, um grupo de cientistas deram um passo adiante na tentativa de esclarecer a situação.
Monitorando e registrando a atividade cerebral de pacientes voluntários durante o sono, os pesquisadores buscaram mais evidências. No procedimento, os participantes eram despertados regularmente e questionados se recordavam do sonho.
Segundo Francesca Siclari, diretora do estudo, eles encontraram uma área extremamente vigilante do cérebro “sonhador”, que chamaram de “zona quente”. “Descobrimos que quando os pacientes relatam um sonho, a atividade cerebral muda nessa parte, que é uma região do cérebro que engloba áreas visuais e também outras que ajudam a integrar várias experiências sensoriais”, disse a diretora.
Os cientistas perceberam que essa área ficava mais desperta quando os pacientes sonhavam – a atividade cerebral era mais rápida, semelhante ao estado consciente. Quando não sonhavam, a atividade era lenta.
Isso se tornou um sinal para tentar prever quando alguém estava sonhando.
“Nós observamos a zona quente do cérebro em tempo real e tentamos prever com base nessa atividade se a pessoa estava sonhando ou não. Então, acordávamos o paciente para ver se nossa previsão estava correta – e acertamos em 90% dos casos”, afirmou Francesca Siclari.
Segundo Mark Blaygrove, o estudo mostra que uma região do cérebro está ligada às fases do sono e opera como um interruptor.
“Se conseguíssemos descobrir o que ativa o interruptor, o que faz com que ele ligue e desligue, poderíamos saber por que o sonho começa de repente ou acaba”, diz.
A resposta poderia explicar por que os sonhos são úteis e se, de alguma forma, podemos controlá-los. Os estudos sobre sonhos e sua utilidade continuarão ao longo dos próximos anos e é provável que novas perguntas apareçam a cada nova descoberta.
O que você acha sobre o mundo dos sonhos? Tem alguma teoria ou experiência? Conte nos comentários!
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Imagens: reprodução Getty Images.
Com informações de: BBC.
Comentários
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